Baú de Contos: O Paradoxo da Gaivota - Capítulo 3 [Redenção]

 

Capítulo 2👈


Capítulo 3 

Redenção



A respiração arfante trouxe Gaivota à realidade uma vez mais, mas desta vez ele permaneceu com os olhos fechados. Tinha medo de abri-los. Não fazia ideia de onde estava, mas um vento que soprou ligeiro bateu na sua face de uma maneira demasiado habitual para que continuasse na dúvida.

Abriu os olhos: estava em pé, envolto pelo colorido das tendas e pelo barulho das várias atrações que se espalhavam pela feira. Um balão vermelho atravessou o seu olhar, provocando um arrepio que eriçou o pelo dos seus braços.

Temeroso, olhou para as costas da sua mão esquerda. O algarismo zero brilhou por instantes antes de desaparecer completamente. Apenas a gaivota, agora com as asas bem abertas, permanecia.

Estava em frente à banca do algodão-doce e, quase sem dar conta, percebeu que remexia a algibeira, segurando a ponta e mola que girava nervosamente entre os seus dedos.

Esperou um pouco, mas nada aconteceu: nenhuma outra versão de si, nenhum grito, nenhuma perseguição.

Inundado por uma leveza que há muito não sentia, deixou uma lágrima rolar pela sua bochecha. Os lábios tremeram:

— Finalmente acabou!

Sem mais demoras, aproximou-se da vendedora que enrolava fios de caramelo colorido.



***



— Senhor dos balões, senhor dos balões! Viu o meu pai? — perguntou Rita, ao aproximar-se ainda em passo de corrida.

O vendedor, quase sem olhar para ela, falou em voz alta na direção de alguém que se encontrava embrenhado no meio da multidão.

— Está aqui a sua filha, venha cá… está aqui! — chamou-o com o braço, gesticulando efusivamente.

Os olhos da menina lacrimejaram ao ver o seu pai a aparecer do meio de uma confusão de pessoas que andavam de um lado para o outro.

Os dois abraçaram-se.

— Onde estavas? Fartei-me de procurar por ti, Rita. Já não te avisei para nunca saíres do meu lado! — ralhou o pai, visivelmente irritado, sem, contudo, soltar o abraço que a levantou do chão.

— Desculpa, papá, desculpa. Não torna a acontecer… — soluçou ela, agarrada com firmeza ao pescoço do pai.

Ainda nos braços dele, de cabeça encostada ao pescoço e de olhos fechados, ouviu o pai a agradecer ao vendedor.

Gentilmente, pousou-a no chão e perguntou:

— O que aconteceu? E onde arranjaste isso?

Rita segurava um enorme novelo de algodão-doce cor de rosa que não havia largado nem quando o seu pai a pegara ao colo. Explicou toda a história: como correra atrás do balão, do medo que sentira da tenda dos esqueletos e da maneira engraçada como as rãs saltavam de pedra em pedra no pequeno riacho que corria mais adiante.

— … depois, apareceu um senhor muito simpático que me ajudou a atravessar a tenda que metia medo e ainda me deu este doce!

A cara de Rita abriu-se num sorriso de orelha a orelha; era impossível alguém permanecer zangado perante uma coisa tão adorável como aquela.

Os dois continuaram caminho de mão dada. Rita olhou para trás a tempo de ver o homem simpático que a tinha ajudado. Ele olhava-a de longe.

Ela acenou-lhe num adeus com a mão, viu-o a tirar o carapuço da cabeça e a desaparecer no meio da turba.

Saltitou ainda de mão dada ao pai.

Estava agora em segurança e, sem dúvida alguma, com uma lição bem aprendida.


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